"Uma das coisas mais difíceis de serem entendidas pelas pessoas em nossa cultura é o fato de que se fazemos algo que é bom, continuar a fazê-lo não será necessariamente melhor." (p. 38)
Na semana passada, depois de voltar do sufoco do centro comercial da cidade, sentei na minha poltrona predileta e finalizei a leitura do livro O Ponto de Mutação (The Turning Point, 1982), ensaio bastante famoso escrito pelo físico austríaco Fritjof Capra, autor do também best-seller O tao da Física.
Capra é muito conhecido no mundo todo por sua visão holística da realidade, visão essa que condena todos os paradigmas fragmentados da Ciência e abraça uma concepção inter-dependente dos fenômenos que a própria Ciência estuda.
Sinopse: Neste livro, Capra compara o pensamento cartesiano ao paradigma emergente no século XX. O primeiro é reducionista e modelo para o método científico desenvolvido nos últimos séculos. O segundo, holístico ou sistêmico, vê o todo como indissociável; o estudo das partes não permite conhecer o funcionamento do organismo. As comparações são feitas em vários campos da cultura ocidental atual, como a medicina, a biologia, a psicologia e a economia.
O Ponto de Mutação foi um dos melhores livros de não-ficção – provavelmente, o melhor – que li até hoje. Até então, nunca vira a Ciência tão unida, tão compenetrada, tão veiculada a um único objetivo comum. Depois de tê-lo lido, larguei de vez a idéia de que possam existir ao menos duas áreas da Ciência que não se complementam ou, pior, que se rivalizam. Isso realmente não pode existir. A natureza manifesta-se de uma forma surpreendentemente harmônica, e a Ciência, que a estuda, não pode ser diferente.
O livro é dividido em quatro grandes unidades, a saber: "Crise e transformação", "Os dois paradigmas", "A influência do pensamento cartesiano-newtoniano" e "A nova visão da realidade". No início, Capra nos alerta para a crise planetária na qual a sociedade humana, no final do século XX, está inserida. E tal crise é multifacetada, abrangendo desde problemas como a corrida armamentista (lembrando que o livro foi escrito na década de 80) até a fome mundial e a concepção de saúde em Medicina.
O tao da Física e A teia da vida
Na unidade seguinte, o autor traça um corte histórico da sociedade humana nos séculos passados e mostra como os pensamentos de René Descartes e, depois, Isaac Newton modelaram a concepção de mundo que até hoje nós insistimos em ter: fragmentada, causal e independente. Tal concepção cartesiana-newtoniana pode ter se mostrado muitíssimo frutífera no tempo de Descartes e Newton, mas, na nossa sociedade atual, tal visão de realidade é extremamente limitada e pouco elucidativa – portanto, ultrapassada.
E este é o principal objetivo do ensaio: mostrar como essa visão ultrapassada agora se manifesta perigosa, na medida em que aplica conceitos obsoletos a aspectos vitais de nossa existência, como por exemplo à Medicina, à Psicologia, à Economia ou à Biologia. Partindo da famosa divisão cartesiana mecanicista entre mente e corpo, os médicos negaram que processos psicológicos podem influenciar o organismo biológico, e, também, os psicólogos passaram a negar a influência do organismo biológico no nível mental.
Passeando por áreas tão diversas com uma propriedade inabalável, o autor se mostra ele mesmo holístico, interligando conceitos de uma área à outra na mesma frase ou parágrafo. Além disso, convém dizer que Fritjof Capra é um pesquisador extremamente inteligente e minucioso – o que dá gosto em sua escrita –, embora ele afirme modestamente no prefácio: "(…) estou perfeitamente cônscio de que a apresentação (…) será fatalmente superficial, dadas as limitações de (…) meus conhecimentos".
Pôsters do filme baseado no livro
Depois de evidenciar como a concepção mecanicista de Descartes e Newton influencia negativamente a Ciência de nossa sociedade atual, Capra não abandona o leitor: pelo contrário, ele passa a explanar em detalhes aquilo que julga ser o caminho certo. Na última unidade, ele explica como a abordagem holística (também chamada de sistêmica) pode ajudar as ciências a unificar seus conhecimentos em prol de uma melhor qualidade de vida geral.
Como exemplo disso, podemos citar a forte ênfase que o autor dá ao planejamento de uma nova fonte de energia sustentável – a energia solar.
A linguagem de Capra é nitidamente acessível, e o livro O Ponto de Mutação, nas palavras do próprio, "destina-se ao leitor comum", muito embora seja necessário um grande interesse por parte do leitor para continuar com o livro nas mãos.
Posso concluir esta resenha transcrevendo alguns dos elogios feitos por alguns jornais:
"Um livro cheio de força… Informativo, provocante e radical. Com clareza devastadora, Capra mostra como, em todos os campos da Ciência, nossas teorias estão nos levando para nossa própria destruição." Carl Rodgers, Ph. D.
"O Ponto de Mutação é uma explicação bem-escrita e convincente do motivo pelo qual tantas coisas parecem erradas no mundo." The Washington Post.
"De vez em quando publica-se um livro com o poder de mudar radicalmente as nossas vidas. O Ponto de Mutação é o mais recente deles." West Coast Review of Books.
Conclusão: sem dúvida, um livro indispensável para quem deseja ampliar sua visão de mundo. Fico triste por apresentar uma resenha tão pobre sobre um livro tão rico de idéias. Vale conferir.
P.S.: O Ponto de Mutação foi, de algum modo, adaptado para o cinema. No original inglês, o longa levou o título de Mindwalk, mas aqui no Brasil o nome permaneceu o mesmo do livro. Abaixo, uma parte do filme bem interessante:
Olá Marlo pelo visto com a leitura deste livro você saiu um pouco do rotineiro, mas como você diz no mundo tudo se completa, e não podemos enxergar as diferentes vertentes como competição.
ResponderExcluirParabéns pelo texto.
Hello, Marlo-kun!
ResponderExcluirPois é, essa idéia de interligar as ciências é algo de que escutei muito nesse ano. Mesmo numa simples prova de vestibular, o conhecimento abrangente começa a se mostrar mais necessário!
Pena que eu sou como um Sherlock Holmes da vida, só gosto de encher meu sótão com as poucas coisas que me interessam... Vá entender!
Anyway, ótimo post, nada a desejar!
Beijocas,
Paula Guerra
Olá, Gustavo!
ResponderExcluirRealmente, com este livro eu saí da leitura costumeira que vinha tendo esses últimos anos. Aguçou minha curiosidade para novos tipos de leitura, incluindo os livros mais técnicos, saindo do campo da literatura fictícia - mas sem abandoná-lo.
Obrigado pelo elogio e pela visita!
Hello, Paula-chan! :)
ResponderExcluirSorte sua, porque no meu terceiro ano ninguém falava nada de interligar as ciências. Pelo contrário. Víamos cada matéria de uma forma muito distinta, o que tornava tudo muito chato, a meu ver. ^^
Obrigado pelo elogio e pela visita!
Beijocas, garota. x)
Fiquei curioso por esse livro por conta da premissa.... mas sinceramente seu texto me pareceu bem confuso numa primeira lida, tive que ler várias vezes pra entender o que você queria dizer, hahahaha... Mas deu pra ter uma idéia boa do que se trata o livro.
ResponderExcluirLembro também que você me falou que a leitura é tranquila (algo que eu deixaria mais claro no texto), por mais que você meio que contradiz isso no texto ("embora seja necessário um grande interesse por parte do leitor para continuar com o livro nas mãos").
De qualquer maneira vou tentar ler algum trecho pra ver se me interessa o bastante para ler a obra completa.
Abraço!