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30 dezembro 2008

Norwegian Wood, de Haruki Murakami



Hoje pela tarde acabei de ler o famoso best-seller do japonês Haruki Murakami: "Norwegian Wood", cujo título é inspirado em uma canção dos Beatles e cujas vendas chegaram à casa dos 4 milhões de exemplares, somente no Japão.

Atrás do livro, a sinopse que a editora Alfaguara colocou é bem simples: Toru Watanabe tem 19 anos e é um jovem estudante de teatro que vive uma vida aparentemente normal em Tóquio, onde mora em um alojamento exclusivo para universitários e tem de conviver com colegas excêntricos. No entanto, depois que ele reencontra uma antiga amiga enquanto passeava pelas ruas da cidade, seu universo pacato é abalado - essa garota, Naoko, era a namorada do seu melhor amigo que, aos 17 anos, suicidou-se. Esse é, praticamente, o único fato que une os dois, e ambos tentarão viver uma espécie de amor proibido, cheio de encontros e desencontros, tendo ainda de suportar a perda do ente em comum.

Murakami é conhecido por ser um escritor oriental que faz muitas referências ao mundo ocidental em suas obras. O ano em que se passa a história é 1969, portanto auge do rock n' roll e das agitações políticas, e nela o autor enche de nomes como Jim Morrison, Beatles, Scott Fitzgerald e Thomas Mann. Isso dá certa consistência à obra, fazendo com que os leitores se sintam mais próximos da realidade enquanto lêem o livro: "Aos 18 anos, meu livro favorito era Centauro, de John Updike (...)" [página 42]; "Ao meu redor, o mundo estava prestes a se transformar radicalmente. Nessa época, muitas pessoas morreram, inclusive John Coltrane." [página 291]. Particularmente, aprecio essa técnica literária que consiste em entremear fato e ficção.

"Norwegian Wood" é um livro aparentemente normal mas que, à medida que você lê, se dá conta de que não é tão superficial assim. A obra tem um grande poder e é excepcionalmente bem escrita. Muitos diálogos entre as personagens são interessantíssimos e merecem atenção redobrada. Exemplos: a garota Midori comparando a vida com um pote de biscoitos [página 309], o egoísta Nagasawa falando sobre a humanidade [página 252] e os belos conselhos de Reiko Ishida nos momentos finais do livro [página 331]. Todas essas passagens trazem bonitas lições. Na verdade, o livro todo é uma grande lição. Eu diria que "Norwegian Wood" é um livro sobre as decisões que nós tomamos ao longo da vida, e sobre o peso que elas têm no nosso destino.

Mesmo assim, não leia "NW" pensando que isso vá elevar sua auto-estima. Pelo contrário, é capaz de o deixar ainda mais deprimido. No entanto, a obra suscita muitos pensamentos inauditos e reflexões são inevitáveis. Fala sobre libertinagem, amadurecimento e amor em tempos difíceis. Esse é o mérito do livro: faz você pensar em sua própria vida, e no que está fazendo para melhorá-la.



Agora, estou esperando a virada do ano para começar a ler “Kafka à Beira-Mar”, também do mesmo autor.

11 dezembro 2008

Almas perdidas e lugares inóspitos.


Aversão ao capitalismo, relevamento de ideais tolstoianos, introspecção social e outras características afins costumam ser percebidas em pessoas que não se encaixam na sociedade moderna. É o caso do americano Christopher Johnson McCandless, jovem de família rica que - aos 22 anos - abdicou sua vida economicamente confortável e foi se aventurar pelos Estados Unidos numa viagem errante apelidada por ele de "grande odisséia alasquiana". Objetivo: cruzar o país e seguir rumo ao Alasca longínquo, na tentativa de, segundo suas próprias palavras, "exterminar o falso ser interior e concluir com sucesso a revolução espiritual".

É verdade que a maior parte de nós já teve o inevitável desejo de fugir das pessoas circundantes por um tempo, visitar lugares exóticos que exaltem a espiritualidade, conhecer pessoas de diferentes culturas e "fazer o bem a gente simples, que não está acostumada a ser servida" (Liev Tolstoi, Felicidade Familiar). No entanto, são poucos os indivíduos que realmente levam isso a sério, numa resolução quase religiosa, e partem para a empreitada. Visitando os lugares mais inóspitos possíveis - como tundras e desertos - esses voyuers obstinados infelizmente terminam a sua jornada da mesma maneira: em vez de encontrarem paz de espírito, encontram a morte na forma mais cruel possível.

O exemplo de misantropia relativamente famoso que me chamou a atenção foi o caso anteriormente citado de Chris McCandless. Ele não era louco de maneira alguma, mas tinha suas qualidades peculiares; idolatrava Jack London a ponto de considerá-lo um semi-deus, lia muitas obras de Liev Tolstoi e Henry David Thoreau (ambos criticando o estilo de vida comum, exaltando um maior convívio com a natureza), tinha uma relação extremamente difícil com os pais e não gostava nem um pouco do "oneroso dever de se formar na faculdade". Além disso tudo, como qualquer seguidor thoureano, Chris repudiava o dinheiro e todos os bens materiais, considerando-os "um roubo e uma injustiça para com os menos afortunados".

Cansado de ter que tolerar os pais e essa vida ordinária que levava, McCandless fugiu de casa em 1990, após sair da Emory University, e foi cumprir seu objetivo: caminhar erroneamente pelo país, apreciando a vida em seus elementos mais simples, até chegar ao Alasca e revolucionar seu espírito numa comunhão com a natureza.

Eis que, depois de dois anos pegando carona nas estradas estadunidenses, em 1992, McCandless desce triunfante no Alasca. Andando pelas colinas geladas de lá, ele encontra um ônibus abandonado no meio da taiga - 142 Fairbanks City Transit System - e o toma como seu lar; morreria dentro desse ônibus poucos meses depois, de inanição, após ingerir acidentalmente uma planta venenosa.
Chris era conhecido como uma pessoa fechada, introspecta, que às vezes detestava o convívio social e mesmo vituperava contra seus amigos mais íntimos. Durante sua "grande odisséia alasquiana", ele conheceu muita gente, e chegou inclusive a trabalhar para algumas pessoas. Mesmo assim, tinha muito cuidado em não se expor às emoções humanas e se deixar levar pelos sentimentos, fazendo amizades muito fortes. Seu convívio com os demais era sempre muito restrito, muito superficial. "Você está enganado se acha que a felicidade emana somente ou principalmente das relações humanas", dissera ele a um velho que conhecera em Salton City. "A felicidade está em tudo o que Deus colocou à nossa volta".

No entanto, sua revolução espiritual durante os meses que passou no Alasca foi tamanha que, momentos antes de morrer no ônibus, ele escreveu sorumbaticamente: Felicidade só real quando compartilhada.

Na minha opinião, o que torna Christopher McCandless grandioso é o fato de ele ter ido em busca do que queria, enfrentando as conseqüências. E, também, pela lição que ele deixou. Mesmo sendo um clichê, sua última frase escrita tem um peso enorme, porque foi algo extraído de uma experiência genuína muito forte.

A história deste jovem rapaz foi magnificamente contada em detalhes no livro Na Natureza Selvagem, de Jon Krakauer. E, no campo do cinema, foi retratada no longa homônimo dirigido por Sean Penn, em 2007.

07 dezembro 2008

Atores brasileiros e nudez nos cinemas.

Me deparo hoje com o nº 49 da revista Veja sobre o balcão da banca de jornal que eu freqüento. A capa anuncia uma matéria sobre nudez pública e suas conseqüências para a nossa sociedade "humanizada" - até que ponto a nudez é ofensiva?, perguntam os jornalistas da revista.
Como sempre acontece comigo (principalmente em se tratando de revistas e livros), puxo o dinheiro do bolso e levo a edição por impulso. Ainda caminhando, voltando para casa, abro-a e vou direto à matéria em questão (isso depois de ter passado pelos inevitáveis mini-artigos que os redatores ainda insistem em publicar sobre Britney Spears, Cristiano Ronaldo, Paris Hilton e etc.)
Na página 148, finalmente leio: "Puritanismo envergonhado". Olho em torno da praça na qual eu estou, avisto um banco, caminho até ele e sento. Ponho minha mochila de lado. Continuo lendo o lead, até que vejo: "É (...) intrigante que [a nudez] esteja sendo contestada agora no Brasil por atores e atrizes."
Observo novamente as redondezas da praça e, quando percebo que estou realmente sozinho, começo a rir. Realmente, é intrigante que os atores brasileiros estejam contestando a nudez. Dê uma olhada nos filmes nacionais que rodam por aí. A maioria deles têm, no mínimo, 1 minuto de pornografia. Não estou exagerando. Afirmo isso com toda a certeza possível.
Bem, de qualquer forma, decido não me precipitar e continuo lendo a matéria (por sinal, muito bem escrita por Marcelo Bortoloti). No texto, vejo que quem alavancou a discussão foi o ator Pedro Cardoso, quando palestrou sobre o assunto no lançamento do seu filme e escreveu algo em seu blog. Concordo plenamente com a iniciativa dele, principalmente ao dizer que "a pornografia tornou-se agora um modo de atrair o público. Temos visto cenas de nudez ou quase nudez em basicamente toda a programação dos programas de televisão brasileiros".
Algumas atrizes deram depoimento à reportagem da Veja e algumas delas - como Maitê Proença, que já posou 2 vezes para revistas masculinas - dizem que se expor para as câmeras sempre traz certo constrangimento.
Nota mental: se a comunidade cineasta brasileira é, de certa forma, contrária à nudez presente nos filmes e revistas, então por que os atores, atrizes e diretores ainda se submetem a essa prática?
Sentado no banco da praça, leio mais um pouco. "Não deixa de ser intrigante que essa questão esteja sendo discutida no Brasil nos dias atuais", escreve Marcelo. Concordo. O Brasil sempre foi (e não deixou de ser ainda) o país dos biquínis, do Carnaval, da pornochanchada. Agora, os atores brasileiros estão querendo criticar a nudez, quando, justamente, é o próprio cinema que mais endossa esse detalhe.
Finalizo a leitura, fecho a revista e volto a caminhar em direção à minha casa. Particularmente, eu nunca (nunca, mesmo!) gostei de nenhum filme que exibisse uma cena de sexo por mais de 1 minuto. Acho que essa tática é uma pura falta de criatividade, um puro alarmismo, uma pura tentativa forçada de fisgar o telespectador para a tela - quando na verdade não funciona, pelo menos não com o telespectador sensato, apreciador do bom cinema.
O que faz um bom filme não é a quantidade de sexo que existe nele, e sim a qualidade do roteiro pelo qual a trama é conduzida. Tenho a impressão de que os diretores brasileiros se esquecem disso, ou nunca aprenderam. Na verdade aproveito a deixa para reclamar que, no Brasil, as cenas eróticas pululam nas telas dos filmes nacionais, ferindo os olhos dos fãs de cinema como eu. Certo dia, assisti a um filme (brasileiro) que mostrava uma cena erótica por mais de 5 minutos. Imaginei ter entrado na sala errada, até que finalmente voltei a ver o rosto dos atores. Pensei com asco que aquilo era ridículo, porque o filme realmente não precisava daquela cena.
De qualquer forma, se os atores brasileiros continuarem contestando a nudez explícita e desnecessária nos filmes daqui e se recusarem a filmar qualquer coisa do gênero, eu dou o meu maior apoio. Mas, por outro lado, se isso for apenas uma modinha, se os atores brasileiros contestarem o erotismo nas telas e continuarem a filmar coisas afins, eu digo que isso é querer chamar atenção.
No entanto, deixando de lado a minha impiedade, fico satisfeito ao ver que alguém (mesmo que tardiamente) pôs a boca no trombone e retaliou a nudez do cinema brasileiro. Me refiro a Pedro Cardoso. Fico satisfeito ao saber que não sou o único a não gostar dessa falta de vergonha apelidada de "arte".
pós-escrito: o que mais me fez rir foi um depoimento da atriz Cristiana Oliveira na página 151. Diz ela: "Não fico nem um pouco à vontade atuando sem roupa. Já fui convidada para fazer trabalhos em cinema, no Brasil (...), que recusei por conta disso, achei apelativo. A nudez não pode ser maior que a história."
Bonito discurso. Eu concordo com essas palavras, mas, vindo da Cristiana, elas soam contraditórias: a atriz participa da reprise de Pantanal (a novela mais pornográfica da história do nosso país) e já posou nua para uma revista masculina.