“No avesso de tudo que acreditamos identificar perfeitamente, esconde-se uma quantidade igual do desconhecido.” (p. 148)
Ontem pela noite eu finalizei a leitura do romance japonês Minha querida Sputnik (Sputnik Sweetheart, 2001), que era o último livro do Murakami que restava para eu ler em português brasileiro.
Depois de ter iniciado a maratona de leitura de suas obras no início do ano passado, e ter lido inclusive todos os livros em rápida sucessão, me pergunto por que motivo protelei tanto a leitura de Minha querida Sputnik, a ponto de só tê-lo lido agora. Não faço a menor idéia do motivo. Não mesmo.
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Sinopse: O livro, com mais de 600 mil exemplares já vendidos no Japão, conta a história de Sumire, uma jovem de 22 anos que se apaixona pela primeira vez. Uma paixão avassaladora que tem como alvo Miu, uma mulher casada e 17 anos mais velha. Mas, enquanto Miu é uma mulher glamorosa e bem-sucedida negociante de vinhos, Sumire é uma aspirante a escritora que se veste e se comporta como um personagem de Jack Kerouac mas que, em nome do desejo, é obrigada a dar outro rumo a sua trajetória.
NOVO! Leia capítulos do livro aqui neste link.
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Tenho uma teoria literária. Na verdade, não se trata bem de uma teoria, mas de uma obviedade. Posso resumi-la assim: quando você lê muitos livros de um mesmo autor, começa a perceber aquilo que se repete em sua obra. Em outras palavras, começa a perceber o que não é original nele próprio (ou seria isso a sua "marca registrada"?) Foi assim com Michael Crichton, com Dan Brown, com Charles Bukowski etc. E foi assim com Haruki Murakami.
Na verdade, desde Caçando carneiros eu já percebera que existe algo que se repete muito em seus livros, e, quando o leitor se dá conta disso, começa a se sentir um pouco incomodado: em Murakami, os personagens principais que narram a história são sempre muito parecidos entre si. Parecidos a ponto de terem quase a mesma aparência (posso imaginar isso), vivenciarem quase as mesmas coisas e terem praticamente a mesma filosofia de vida.
Não que isso seja um erro. Não é. Mas faz com que os livros que ficaram para o final da lista percam o seu brilho, a sua originalidade. A prova disso é que achei Norwegian Wood e Kafka à beira-mar seus melhores livros, e foram os dois primeiros que li. Também achei Após o anoitecer muito bom, mas porque não repete a dose de narrador-protagonista. Os outros, desde Caçando carneiros até Minha querida Sputnik, tiveram o brilho esmaecido por conta da repetição da personalidade do protagonista. Se eu os tivesse lido antes, teria-os achado bem mais marcantes.
Mas, enfim, apesar disso, Minha querida Sputnik é um livro que adorei. Carrega todo aquele estilo característico do Murakami (muita música, muitos livros, muita referência ao sexo) e é um dos mais densos do autor, suponho. Depois do "Documento 1", escrito pela personagem Sumire, o leitor é convidado a uma série de reflexões complexas que penetram fundo na alma e vão até o final do romance.
O elemento fantástico, tão caro na obra do autor, foi bem explorado aqui. Adoro a inserção de elementos fantásticos nos livros do Murakami porque eles não são colocados ali aleatoriamente, a esmo, embora assim pareça sempre; não, eles sempre carregam um sentido, que o leitor decifra por si mesmo no final. O absurdo nunca é posto nas histórias de Murakami sem que haja, cedo ou tarde, um lampejo de compreensão por parte do leitor.
Conclusão: recomendadíssimo.
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Minha querida Sputnik traz, como sempre em Murakami, personagens que navegam à margem da sociedade, solitários, em busca de uma relação sólida a que se agarrar. Um trecho do livro que ilustra isso muito bem é o seguinte:
“Então me ocorreu que, apesar de sermos companheiras de viagem maravilhosas, no fundo, não passávamos de duas massas solitárias de metal em suas próprias órbitas separadas. A distância, parecem belas estrelas cadentes, mas, na realidade, não passam de prisões, em que cada uma de nós está trancada, sozinha, indo a lugar nenhum. Quando a órbita desses dois satélites se cruzam, acidentalmente, podemos estar juntas. (…) Mas só por um breve momento. No instante seguinte, estaremos na solidão absoluta. Até nos queimarmos completamente e nos tornarmos nada.” (p. 132)
Concordo plenamente com a sua observação sobre o Murakami, mas pra mim essa característica é justamente o que mais gosto nas obras dele.
ResponderExcluirEu sempre recomendo 'Minha Querida Sputnik' como o primeiro livro do Murakami pros meus amigos, pois tem todas as características marcantes dele, ao mesmo tempo que é um dos mais 'fáceis' de ler dele.
É uma pena mesmo que você não tenha domínio da lingua inglesa, pra mim os melhores livros do Murakami são com certeza 'Hard-Boiled Wonderland and The End of the World' e 'The Wind-Up Bird Chronicle', nesses dois Murakami utiliza sim de suas características básicas, mas consegue contruir tramas e personagens muitíssimos interessantes.
Té mais!
Essa questão de os protagonistas do Murakami serem sempre muito parecidos entre si realmente não configura uma falha na obra dele - é, antes, um estilo característico, que algumas pessoas como você gostam. Eu gosto também; o problema é que, depois de tantas vezes, acabei me acostumando muito a isso e achei que ele poderia variar mais. ^^
ResponderExcluirConcordo quando você diz que 'Minha querida Sputnik' é o romance mais leve dele, mas por alguma razão achei certas passagens mais densas que o habitual. O Murakami sempre teve aquele jeito complexo de narrar sentimentos, mas no livro em questão eu acho que é mais complexo. Em suma, é um livro muito bom.
Realmente é uma pena que, para ler livros em inglês, eu perca muito tempo traduzindo e, assim, desvie a minha atenção da história em si para o tedioso trabalho de traduzir. Se não fosse por isso, eu estaria no paraíso, lendo livros de autores que aprecio e que, infelizmente, não possuem todas as obras publicadas aqui. ^^
Até mais, abração! :D