Pesquisar neste Blog

11 dezembro 2008

Almas perdidas e lugares inóspitos.


Aversão ao capitalismo, relevamento de ideais tolstoianos, introspecção social e outras características afins costumam ser percebidas em pessoas que não se encaixam na sociedade moderna. É o caso do americano Christopher Johnson McCandless, jovem de família rica que - aos 22 anos - abdicou sua vida economicamente confortável e foi se aventurar pelos Estados Unidos numa viagem errante apelidada por ele de "grande odisséia alasquiana". Objetivo: cruzar o país e seguir rumo ao Alasca longínquo, na tentativa de, segundo suas próprias palavras, "exterminar o falso ser interior e concluir com sucesso a revolução espiritual".

É verdade que a maior parte de nós já teve o inevitável desejo de fugir das pessoas circundantes por um tempo, visitar lugares exóticos que exaltem a espiritualidade, conhecer pessoas de diferentes culturas e "fazer o bem a gente simples, que não está acostumada a ser servida" (Liev Tolstoi, Felicidade Familiar). No entanto, são poucos os indivíduos que realmente levam isso a sério, numa resolução quase religiosa, e partem para a empreitada. Visitando os lugares mais inóspitos possíveis - como tundras e desertos - esses voyuers obstinados infelizmente terminam a sua jornada da mesma maneira: em vez de encontrarem paz de espírito, encontram a morte na forma mais cruel possível.

O exemplo de misantropia relativamente famoso que me chamou a atenção foi o caso anteriormente citado de Chris McCandless. Ele não era louco de maneira alguma, mas tinha suas qualidades peculiares; idolatrava Jack London a ponto de considerá-lo um semi-deus, lia muitas obras de Liev Tolstoi e Henry David Thoreau (ambos criticando o estilo de vida comum, exaltando um maior convívio com a natureza), tinha uma relação extremamente difícil com os pais e não gostava nem um pouco do "oneroso dever de se formar na faculdade". Além disso tudo, como qualquer seguidor thoureano, Chris repudiava o dinheiro e todos os bens materiais, considerando-os "um roubo e uma injustiça para com os menos afortunados".

Cansado de ter que tolerar os pais e essa vida ordinária que levava, McCandless fugiu de casa em 1990, após sair da Emory University, e foi cumprir seu objetivo: caminhar erroneamente pelo país, apreciando a vida em seus elementos mais simples, até chegar ao Alasca e revolucionar seu espírito numa comunhão com a natureza.

Eis que, depois de dois anos pegando carona nas estradas estadunidenses, em 1992, McCandless desce triunfante no Alasca. Andando pelas colinas geladas de lá, ele encontra um ônibus abandonado no meio da taiga - 142 Fairbanks City Transit System - e o toma como seu lar; morreria dentro desse ônibus poucos meses depois, de inanição, após ingerir acidentalmente uma planta venenosa.
Chris era conhecido como uma pessoa fechada, introspecta, que às vezes detestava o convívio social e mesmo vituperava contra seus amigos mais íntimos. Durante sua "grande odisséia alasquiana", ele conheceu muita gente, e chegou inclusive a trabalhar para algumas pessoas. Mesmo assim, tinha muito cuidado em não se expor às emoções humanas e se deixar levar pelos sentimentos, fazendo amizades muito fortes. Seu convívio com os demais era sempre muito restrito, muito superficial. "Você está enganado se acha que a felicidade emana somente ou principalmente das relações humanas", dissera ele a um velho que conhecera em Salton City. "A felicidade está em tudo o que Deus colocou à nossa volta".

No entanto, sua revolução espiritual durante os meses que passou no Alasca foi tamanha que, momentos antes de morrer no ônibus, ele escreveu sorumbaticamente: Felicidade só real quando compartilhada.

Na minha opinião, o que torna Christopher McCandless grandioso é o fato de ele ter ido em busca do que queria, enfrentando as conseqüências. E, também, pela lição que ele deixou. Mesmo sendo um clichê, sua última frase escrita tem um peso enorme, porque foi algo extraído de uma experiência genuína muito forte.

A história deste jovem rapaz foi magnificamente contada em detalhes no livro Na Natureza Selvagem, de Jon Krakauer. E, no campo do cinema, foi retratada no longa homônimo dirigido por Sean Penn, em 2007.

5 comentários:

  1. ele era um projeto de hippie,tenho certeza... ;P

    ResponderExcluir
  2. caralho; uma crônica digna de um bom jornal...
    dava pra ser premiada algum dia desses...
    interessante a história..enriqueceu a minha cultura;
    obrigado.
    =D

    ResponderExcluir
  3. Amigo já ouviu falar do Everett Ruess?

    ResponderExcluir
  4. Olá! Obrigado pela visita!

    Já ouvi falar de Ruess, sim. Foi no livro 'Na Natureza Selvagem', inclusive. A história dele é muito parecida com a de McCandless, não é?

    Abração!

    ResponderExcluir
  5. Sim, exatamente...até esqueci que ele é citado no livro de Krakauer! Mas também conheci a história dele lá. É sem dúvida uma história interessante, não? Parece que existem dois livros a respeito dele...um diário com anotações das viagens que fazia, poemas e cartas; e uma biografia. Pelas citações no livro de Krakauer, parece valer a pena. Mas temo que aqui no Brasil sejam livros pouco conhecidos...

    Abraço!

    ResponderExcluir

Muito obrigado pela visita ao Gato Branco! Seu comentário será extremamente bem-vindo! :)