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08 abril 2012

Filme: Xingu (2012)

Ontem pela tarde eu deixei os livros de literatura de lado e fui ao cinema conferir, junto com um amigo, a mais recente e comentada produção nacional, Xingu – dirigida pelo gabaritado Cao Hamburger, considerado pela crítica como um dos melhores diretores do país, apesar de sua por enquanto curta carreira.

Em linhas gerais, posso dizer que o filme resume os principais meandros da saga dos três irmãos Villas-Boas no coração da Floresta Amazônica, em sua inusitada missão de estabelecer contato com os povos indígenas espalhados naquela região. O que começa como uma simples "busca por aventura" (nas palavras do próprio Cláudio Villas-Boas) acaba se transformando em um verdadeiro compromisso humanista, já que os três irmãos passam a se identificar plenamente com as culturas indígenas e a buscar uma solução para a questão problemática que, naqueles tempos de expansionismo industrial, foi levantada: o que fazer com os índios brasileiros? Educá-los e torná-los civilizados, livrar-se deles como se sequer existissem ou preservá-los, com toda a sua bagagem cultural?

Os irmãos apostaram nesta última opção, e o filme, de um modo geral, retrata a luta que eles tomaram para si com o objetivo de garantir os direitos aos povos indígenas presentes no território do nosso país, o que culminou na criação do Parque Nacional do Xingu – cujos 50 anos de existência foram comemorados em 2011.

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De início, não há como se deixar enganar: o tom aventuresco do filme – que o próprio pôster claramente se encarrega de exibir – está presente em toda a obra, desde o início até o fim da narrativa. A idéia de uma expedição a lugares exóticos, o contato com civilizações diferentes e desconhecidas, a paixão pela exploração geográfica, os mapas sendo traçados na tela (a la Indiana Jones) e fantásticas tomadas de paisagens da floresta e dos rios dão a Xingu um elemento essencial que caracteriza o filme: o apelo à aventura. E é justamente esse apelo que fisga o telespectador, que o convida à história, que o faz mergulhar no mesmo universo fascinante que os irmãos mergulharam há meio século.

É precisamente nesse ponto que entra a sensibilidade dos produtores do filme. Porque, mesmo com esse elemento aventuresco tão saltado aos olhos do telespectador, o que verdadeiramente subjaz é a carga dramática, não só da missão humanista encabeçada pelos irmãos, mas do contato mesmo com as tribos indígenas que até então eram desconhecidas pelo homem branco. É quando se explora esse drama que o filme ganha força e consistência. A cena da primeira aproximação dos irmãos com os índios, por exemplo, é relevante não pelo caráter da aventura, mas pelo sentido que isso tem para nós, brasileiros; quando vi tal cena, a primeira coisa em que pensei foi "É tão estranho o fato de haver outras pessoas no nosso território que nós, ditos civilizados, consideramos inferiores, por uma mera questão de grau, não de essência".


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Cláudio Villas-Boas dividindo, junto com os índios, os territórios a serem ocupados pelas diferentes tribos no Parque Nacional


Sem soltar nenhum tipo de spoiler, eu gostaria de deixar aqui a minha impressão sobre a última cena do filme. Que cena! Na minha opinião, ela captura todo o cerne do choque entre as civilizações, todo o desentendimento humano que surge desse conflito, numa única tomada sem palavras ou diálogos… Apenas com um olhar que traduz toda a comunicação deficiente entre o homem branco e o indígena. Realmente é uma cena muito bem feita. Quem já assistiu sabe do que estou falando.

Em suma, me alegra muito saber que o cinema nacional possui uma vertente que se preocupa não só com as boas idéias, mas também com a qualidade da produção dos filmes. Xingu é um exemplo dessa vertente. Com uma trilha sonora impecável, roteiro consistente, história relevante, fotografia excelente e atuações marcantes – com destaque para Maiarim Kaiabi, um indígena que dá shows de interpretação –, o filme dirigido por Hamburger dá esperança mesmo aos que mais desacreditavam do cinema nacional, como eu.

É isso, Brasil. Mostre os bons filmes que você sabe fazer.


A seguir, o trailer do filme.

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Um comentário:

  1. Excelente crítica. Traduz muito bem o que o diretor pretendeu transmitir (e conseguiu) e tudo o mais que senti e apreendi do filme.

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