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24 setembro 2012

Tremor, de Jonathan Franzen

"(…) você pode acabar se perguntando por que organizou a sua vida como se você não passasse de uma máquina voltada para a desprazerosa produção e o prazeroso consumo de mercadorias." (p. 332)

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Não é sempre que tenho a coragem necessária – e a disposição, e a iniciativa, e tudo o mais – para iniciar a leitura de um romance extenso em plena época de aulas, provas e estágios em laboratórios de pesquisa. Tremor (Strong motion, 2001), do super-aclamado escritor contemporâneo Jonathan Franzen, entrou para a lista dessas exceções às quais me dou o direito de conceder de vez em quando. E o resultado disso foi que, em meio a tantos assuntos acadêmicos que não permitem um mergulho maior na Literatura, me diverti (e refleti) bastante com a ajuda deste livro sensacional.

Franzen atualmente é muito citado nos suplementos literários como "o grande romancista norte-americano do início do século XXI", título que o deixa próximo da importância literária de um consagrado Philip Roth. Com a obra Liberdade (que penso em ler no futuro), este norte-americano de Illinois ganhou uma enorme projeção internacional que teve a força de trazer novamente ao mercado as edições de seus romances anteriores – dentre eles, Tremor, seu segundo trabalho.


Sinopse: Louis Holland chega a Boston numa primavera de acontecimentos estranhos – uma série de terremotos de origem suspeita atinge a cidade, e o primeiro deles mata a sua avó postiça, uma guru new age milionária. Durante a disputa pela herança, Louis se apaixona por Renée Seitchek, sismóloga brilhante que o ajudará a descobrir a verdade por trás dos abalos, mas os dois pagarão um preço alto por sua curiosidade ao desvelar os segredos de uma indústria química poderosa.


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Tremor é um exemplar perfeito daquilo que eu costumo chamar de obras "trans-gênero", que não pertencem na essência a nenhuma classificação exclusiva – sendo, antes, a mistura de dois ou mais gêneros tradicionais. Na realidade, grande parte da produção cultural de hoje (principalmente no cinema) está aderindo a essa corrente da quebra de gêneros. Neste livro, por exemplo, Franzen faz uma mistura totalmente equilibrada e lúcida de drama com thriller, o que no final das contas acaba agradando tanto os leitores que gostam de profundidade psicológica quanto os que gostam de enredos agitados por tramas corporativas, cheias de ação e espionagem. E ele faz isso costurando todo o eixo central com uma tocante e sensível história de amores incertos, paixões e laços familiares.

Lendo Tremor o leitor chega à conclusão de que Franzen faz parte daqueles escritores que adoram escrever, adoram contar histórias dentro de histórias e adoram explorar por todos os lados os dramas existenciais de seus personagens, o que inclui também fazer uma ou outra digressão extensa sobre o modo de vida na América. Franzen é um daqueles escritores que, em cada romance que escreve, procura retratar tudo o que existe no mundo, todas as situações prováveis e improváveis, todas as emoções e sentimentos, todas as reflexões sobre os mais variados assuntos. Neste livro que terminei de ler hoje, encontramos uma história que é perpassada por uma miríade de temas tão díspares quanto pode parecer à primeira vista a questão do aborto e a produção de conhecimento científico.


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Franzen: romances de temas amplos com foco nas relações humanas


Uma das coisas que mais agradam na escrita de Jonathan Franzen é que ele não subestima a inteligência do leitor. Com frases às vezes bastante floreadas, incertas, metafóricas demais (mas nunca incompreensíveis), o seu texto dá ao leitor a prazerosa sensação de estar sendo posto para refletir. Repleto de diálogos extremamente memoráveis (a começar pela visita que Louis faz à irmã, Eileen, logo no começo do livro), Tremor se consolidou na minha mente como um romance do qual sempre vou lembrar quando me encontrar em situações parecidas com as que os personagens viveram.

Embora um dos eixos principais do livro seja a investigação que Renée e Louis levam a cabo ao longo de boa parte da trama, o que sustenta o romance está longe de ser apenas esse detalhe. Em Tremor, o verdadeiro sumo da obra está nas relações entre os personagens, relações de amor, paixão, amizade, de família e de tudo. No fundo, Tremor não passa de um novelão, um novelão com qualidade e com uma série de eixos secundários interessantes. (Não posso deixar de mencionar aqui como as páginas 237, 238, 239, 240 e 241 fizeram um retrato assustadoramente preciso de uma situação de vida pela qual eu passava no momento da leitura.)

Resumidamente, é difícil escrever uma resenha coerente sobre um livro tão amplo e diversificado como Tremor, que abarca temas e assuntos tão diferentes e tão sensíveis, coisa que só quem lê na hora é capaz de entendê-los e aproveitá-los. Mesmo assim, fica a minha recomendação para quem pretender ler um livro memorável e muito significativo nos próximos tempos. No mínimo, o que você recebe em troca é a garantia de uma leitura riquíssima em entretenimento; no máximo, um romance que fica para sempre na memória.

2 comentários:

  1. Eu li correções, achei ótimo, tudo que falaram dele e mais um pouco. Por isso fui ler Liberdade, uma cópia ruim de correções. Por vezes o autor se perdeu nas narrativas, parece que ele estava escrevendo um conto dentro de um livro. Tem partes que são muito parecidas com seu primeiro livro, terminei de ler somente porque sou disciplinada, mas achei ruim, um desrespeito com o leitor. Enfim, por essa razão não me deu nenhuma vontade de ler esse outro livro.
    Geane Brizzola

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  2. Olá, Geane! Seja bem-vinda.

    Acatei os grandes elogios que estavam sendo feitos a Franzen e dei uma oportunidade a 'Tremor', que captou minha atenção pela sinopse inusitada. Gostei muito do livro, como disse na postagem, mas só pela leitura dessa obra já percebi que o autor é bastante prolixo naquilo que faz, realmente: histórias dentro de histórias, digressões às vezes completamente "fora do contexto", o que dá ao leitor a ideia de texto esquizofrênico - e cansativo em algumas passagens.

    De fato, achei a premissa de 'As correções' mais atrativa que a de 'Liberdade' - e, agora que você disse que gostou mais do primeiro, vou dar uma atenção especial a ele.

    Abraços, e obrigado pelo comentário, muito pertinente!

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